Pan-africanismo


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O pan-africanismo defende a autodeterminação dos povos africanos e de seus descendentes no mundo. Trata-se de um movimento de ideias políticas, culturais e econômicas com alcance mundial e, especialmente, no continente africano e em alguns países da diáspora negra. 

O conjunto de ideias que embasam o pan-africanismo surge em diferentes partes do mundo entre os séculos XVIII e XIX, mas ganha força nas Américas, inicialmente entre os intelectuais e ativistas negros caribenhos e estadunidenses. Logo depois é teorizado e colocado em prática por intelectuais e políticos africanos em diálogo com ativistas e pensadores da diáspora negra do início do século XX. 

Usado pela primeira vez pelo ativista trindadense Henry Sylvester-Williams (1869-1911), advogado na Conferência de Londres (1990), o termo pan-africanismo surge para denunciar a expropriação de terras sul-africanas por brancos europeus (ingleses e descendentes de holandeses). Mais do que denunciar, o termo aparece associado à necessidade de fortalecimento de uma personalidade africana como forma de resistência ao colonialismo e à exploração capitalista no continente africano.

Durante o século XX, diversos encontros pan-africanos são organizados ao redor do mundo. Em Paris, em 1919, é realizado o I Congresso Pan-Africano, com participação de 57 delegados africanos. O evento é organizado pelo sociólogo estadunidense William Edward Burghardt Du Bois (1868-1963), criador da Associação Americana para o Progresso das Pessoas de Cor (NAACP). Sob o ponto de vista da geopolítica internacional do pós-Primeira Guerra (1914-1918), o congresso tem por objetivo posicionar o continente africano na ordem global, promovendo visibilidade e protagonismo aos cidadãos do continente africano.

Nos anos seguintes acontecem outros congressos em cidades como Londres e Nova Iorque, com representantes de diferentes partes do mundo que se reúnem para pensar sobre o futuro da África e o problema do colonialismo. Mas, durante esses primeiros congressos, prevalece a participação de afrodescendentes fora do continente e de intelectuais brancos antirracistas. Somente com o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), essa realidade passa por mudanças durante a conferência de 1945, em Manchester (Inglaterra), cuja maioria dos representantes é de africanos.

Na história do pan-africanismo, vários intelectuais africanos e da diáspora se destacam, como o estadunidense William Edward Burghardt Du Bois e o jamaicano Marcus Musiah Garvey (1887-1940), que defende a autodeterminação, a justiça e a liberdade para os africanos e seus descendentes. Entre os teóricos do continente africano, os destaques são o nigeriano Nnamdi Azikiwe (1904-1996), o queniano Jomo Kenyatta (1894-1978) e o ganês Kwame Nkrumah (1909-1972). No Brasil, o principal intelectual a difundir o pensamento pan-africano é Abdias do Nascimento (1914-2011). 

O ideário pan-africano influencia vários eventos importantes para os negros da diáspora e para o continente africano. Podem ser destacados diversos encontros decisivos para o pensamento anticolonial em que o pan-africanismo se faz presente, com a  Conferência de Bandung (1955), responsável por um grande salto qualitativo dos países da África e da Ásia contra o colonialismo europeu [1]. O acúmulo das ideias pan-africanas resulta na formação da Organização da Unidade Africana (1963).

No âmbito brasileiro, o Congresso de Cultura Negra, realizado a partir da década de 1970, é a principal reverberação desse movimento internacionalista no país. Nas primeiras décadas do século XXI, os coletivos negros universitários e das periferias dão novas energias para o pan-africanismo. Tornam-se seus principais divulgadores no país e recuperam a leitura de intelectuais negros e negras da segunda metade do século XX.

Ao longo do século XX, o pan-africanismo amplia seus sentidos. Desde esse período é possível afirmar que o termo está associado a um conjunto de ideias como solidariedade, personalidade de integração, libertação, relação entre África e as populações negras da diáspora. A corrente teórica busca colocar fim à opressão europeia e ao neocolonialismo. Seus resultados práticos são o estabelecimento de diálogo e a formação de redes de intelectuais e de políticas entre os países africanos; conexões políticas e culturais entre intelectuais, artistas da diáspora africana e do mundo africano; posicionamento estratégico dos países africanos na geopolítica mundial como agentes de sua história; movimentos de emancipação e independência das nações africanas. Segundo o especialista em pan-africanismo Muryatan Barbosa (1977), trata-se de  um dos movimentos políticos mais importantes da África contemporânea.

O pan-africanismo é um ideário e um conjunto de movimentos que visam romper com a inferiorização da África e de seus descendentes, propondo unidade africana e libertação do colonialismo. Consiste na emancipação social, econômica, cultural e política dos povos do continente e dos descendentes de africanos, dentro e fora da África.

Notas

[1] Ideias pan-africanas influenciam também a Primeira Conferência Internacional dos Escritores e Artistas Negros (Paris, 1956), a Conferência dos Povos Africanos (Acra, 1958) e a Conferência dos Líderes de Estados Africanos (Adis-Abeba, 1963).