Antirracismo
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O antirracismo pode ser definido como práticas individuais ou coletivas contra o racismo, a exemplo da atividade de movimentos sociais e organizações da sociedade civil, da criação de legislações e políticas públicas, além da produção de discursos, ideologias, imagens e representações, isto é, todas as ações de combate a estereótipos, preconceitos, discriminações e desigualdades de cunho racial em diferentes esferas da vida social.
No mundo inteiro, o antirracismo se mostra de modo mais evidente nos movimentos sociais que protestam contra discriminações e preconceitos raciais. Vários são os exemplos na história que atestam o papel dessas associações no combate ao racismo. Nos Estados Unidos, com o Movimento Pelos Direitos Civis, os Panteras Negras e a Associação Nacional para o Progresso dos Homens de Cor (NAACP, em inglês National Association for the Advancement of Colored People). Na França de meados do século XX, com a Liga Internacional contra o Racismo e o Antissemitismo (Licra), a Liga dos Direitos do Homem e o Movimento contra o Racismo e pela Amizade dos Povos (MRAP). Por meio de uma rede de intelectuais e ativistas africanos e caribenhos, identifica-se também no mundo francófono uma expressão antirracista bastante conhecida: o movimento estético e intelectual da negritude. A partir de 2013, o Black Lives Matters se torna a rede antirracista de maior impacto no planeta com as manifestações em todos os continentes do mundo contra o assassinato do afro-estadunidense George Floyd (1973-2020).No Brasil, as organizações coletivas antirracistas aparecem ao longo do século XX, com as Irmandades Religiosas dos Homens Pretos, a Frente Negra Brasileira (1931-1937), o Teatro Experimental do Negro (1944-1968), o Movimento Negro Unificado (MNU) (1978) e o Movimento de Mulheres Negras (1979), a imprensa negra, os clubes sociais negros e, recentemente, a Coalizão Negra por Direitos (2019).
Apesar de ser associado a protestos coletivos, o antirracismo está presente também em campanhas de órgãos internacionais. O boicote mundial ao regime de apartheid na África do Sul (1948-1994) e o movimento pela liberdade a Nelson Mandela (1918-2013) são casos existosos de atuação política de organismos internacionais. Outros exemplos são as conferências internacionais contra discriminação racial [1] e as campanhas antirracismo no mundo do futebol e de outros esportes.
O antirracismo jurídico, por sua vez, está amparado em leis e atos normativos que objetivam combater o racismo, como as ações afirmativas adotadas no país: a Lei n. 12.711/2012, por exemplo, determina a reserva de cotas nas universidades federais para estudantes egressos de escolas públicas e para pessoas negras e indígenas, e a Lei n. 12.990, dispõe 20% das vagas de concursos públicos para pretos e pardos. Outros destaques são o Estatuto da Igualdade Racial, aprovado pelo Congresso Nacional em 2010, bem como suas versões municipais e estaduais, e as leis n. 10.639/03 e 11.645/08, que estabelecem o ensino de História da África e Cultura Afro-brasileira e Indígena. Também devem ser inseridas no campo do antirracismo legal, as legislações que criminalizam o racismo no país.
O antirracismo é também apresentado como ética do cotidiano e das práticas individuais que orientam a ação humana. O livro Pequeno manual antirracista, da filósofa brasileira Djamila Ribeiro (1980), sistematiza as condutas eticamente responsáveis no enfrentamento do racismo, como informar-se sobre o racismo, refletir sobre privilégios do lugar de ser branco na sociedade. Desse modo, o antirracismo pode ser tomado como ética individual e, ao mesmo tempo, universal, isto é, para todas as pessoas.
No campo das ideologias e representações coletivas, o antirracismo também se faz presente, posto que se manifesta na aspiração histórica de superar o racismo, como o panafricanismo, o garveyismo, o quilombismo, o afrocentrismo, o movimento da consciência negra, o black power e a negritude, além do afropessimismo e do afrofuturismo.
Nos meios organizacionais, o afroempreendedorismo estimula práticas de mercado que privilegiam produtos feitos por comunidades negras e fortalecem o consumo deles, visando às representações positivas e ao empoderamento financeiro da população negra. É possível também identificar o antirracismo no campo corporativo com políticas de diversidade no acesso ao mundo organizacional, bem como equidade salarial de diferentes grupos sociais. Outro aspecto é a formação antirracista constante, com publicidade e produtos que contemplam o pluralismo social, não reforcem estereótipos ou imagens negativas de populações afrodescendentes, indígenas ou de outros grupos racializados.
É possível encontrar também antirracismo de Estado por meio de ações para o enfrentamento de desigualdades e discriminações raciais e para o incentivo de políticas públicas e práticas antirracistas na administração pública, como a criação de delegacias contra crimes raciais, secretarias e conselhos de controle. No plano federal, a Secretaria de Igualdade Racial e a Fundação Cultural Palmares são exemplos de instituições cuja história está diretamente vinculada ao antirracismo brasileiro.
Por muito tempo, o antirracismo é identificado como sinônimo do movimento negro, mas essa comparação limita a compreensão de todas as expressões antirracistas. Seu arco abrange ações, representações, normas e condutas que extrapolam os movimentos sociais e pode ser expressado de diferentes formas: no campo jurídico, em políticas públicas, na ética individual, bem como em organizações sociais e formas intelectuais e estéticas.
Notas
1. Ao todo são três conferências mundiais contra o racismo promovidas pela Organização das Nações Unidas (ONU), da segunda metade do século XX ao início do século XXI. As duas primeiras se realizam em Genebra, em 1978 e 1983; a terceira, em Durban, em 2001. A Declaração e a Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, de 1963 e 1965, respectivamente, bem como a Convenção Internacional sobre a Supressão e Punição do Crime de Apartheid, aprovada pela ONU em 1973, são exemplos da comunidade internacional para pressionar Estados nacionais a abolir tanto regimes segregacionaistas, como formas sistemáticas e institucionalizadas de discriminação racial.