Sandra Andrade


1959-

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Sandra Maria da Silva Andrade (Juiz de Fora, Minas Gerais, 1959). Assistente social, liderança quilombola. Com atuação na direção da Federação das Comunidades Quilombolas do Estado de Minas Gerais (N’Golo) e da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), tem contribuído na construção do coletivo de mulheres e do coletivo jurídico. Sandra é uma das principais articuladoras do reconhecimento de Carrapatos da Tabatinga, em Bom Despacho, Minas Gerais, como comunidade quilombola, no ano de 2005. Neste mesmo ano, participa também da fundação da N’Golo e passa a integrar a coordenação da Conaq.

A família de Sandra, que faz parte do grupo de famílias negras descendentes do quilombo de Carrapatos, abandona a cidade de Bom Sucesso, Minas Gerais, ainda na década de 1940, em decorrência do processo de expulsão dos trabalhadores da região, conhecidos como “agregados” das fazendas. Depois de migrar por várias cidades, em meados da década de 1960, a família de Sandra retorna para a comunidade de Tabatinga. Nessa época, Tabatinga consistia em um grupo de casinhas de palha espalhadas pelo morro de argila branca, cujos habitantes, predominantemente negros, são conhecidos por falarem a “língua do negro da Costa”. É ali que a mãe de Sandra, Sebastiana, conhecida como Mãe Tiana, funda o Centro Espírita Mártir São Sebastião e se torna uma referência religiosa, não só entre seus vizinhos, os “negros da Costa”, mas também para as famílias brancas da elite do município de Bom Despacho, além de pessoas vindas de municípios vizinhos em busca de sua ajuda. Ancorada no prestígio e na ascendência religiosos, Mãe Tiana passa a atuar também na luta social pelos direitos do povo negro, tornando-se importante referência nos campos político e cultural da cidade. 

Em 1994, Sandra volta para Bom Despacho e, apesar das conquistas da mãe, ainda encontra um contexto de intenso racismo e discriminação contra os moradores de Carrapatos de Tabatinga. Nas escolas, por exemplo, alguns professores se negam a ensinar crianças negras e, mesmo quando tais ocorrências são denunciadas, a Justiça as ignora.

A partir do início dos anos 2000, Sandra dá continuidade à militância cultural de Tiana como liderança quilombola. Até então, seus investimentos pessoais estão voltados para o estudo e para a formação profissional. Por isso, durante sua juventude mora em Contagem, na casa da avó, trabalhando para sustentar os estudos. Depois de terminar o segundo grau, Sandra se forma como técnica de contabilidade, mas continua a exercer a profissão de cozinheira, iniciada ainda na adolescência.

Os moradores de Tabatinga tomam conhecimento dos novos direitos atribuídos às comunidades quilombolas, em 2003, em decorrência de um projeto da organização não governamental (ONG) Fala Negra, intitulado “Redescobrindo as comunidades quilombolas de Minas Gerais”. Em 2004, a Fundação Cultural Palmares (FCP) visita a comunidade e, no final do mesmo ano, Sandra e sua mãe são convidadas a participar do 1º Encontro de Comunidades Negras e Quilombolas de Minas Gerais. Este evento inaugura a entrada de Sandra na militância do movimento quilombola, quando, por incentivo da mãe, passa a compor a Comissão Quilombola Provisória do estado. 

Em meados de 2005, uma assembleia com a presença de 170 quilombolas, representando as 78 comunidades mineiras então certificadas pela FCP, cria a N’Golo, federação que passa a representar e organizar as comunidades quilombolas do estado de Minas Gerais. A partir de então, Sandra passa a atuar na formação de base, fomentando e apoiando a organização das comunidades, na elaboração de projetos de sustentabilidade e de gestão territorial. Para isso e com base no suporte familiar, abandona a profissão de cozinheira para se dedicar integralmente à militância quilombola. Em 2009, Sandra é eleita presidente da federação, permanecendo no cargo por dois mandatos, até 2016. Ao longo desses anos, boa parte do seu trabalho continua sendo visitar as comunidades de todo o estado para lhes informar sobre seus direitos e sobre a federação. São muitas viagens longas, por estradas de terra precárias e perigosas, feitas em vans ou em motos, muitas vezes sob ameaça de proprietários contrários às comunidades visitadas. Outra parte do trabalho consiste em firmar parcerias com universidades e organizações da sociedade civil para garantir direitos às populações quilombolas. 

Entre 2005 e 2010 Sandra também participa do Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial de Minas Gerais (Conepir-MG) e firma uma parceria com o Sindicato dos Oficiais de Registro Civil de Minas Gerais (Recivil), que dá origem a um programa de regularização de documentos de quilombolas. Um dos problemas que atinge a maioria dos moradores daquelas comunidades é a falta de registro de nascimento e de qualquer outro documento pessoal. Outra iniciativa importante de Sandra como presidente da N’Golo é a parceria firmada com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que, entre 2008 e 2015, realiza uma série de diagnósticos territoriais das comunidades quilombolas.

Em 2010, atua como uma das articuladoras da participação quilombola na Marcha Zumbi + 10. No ano seguinte, é eleita para a coordenação nacional e para a coordenação executiva da Conaq e, em 2013, participa da organização do 1º Encontro Nacional de Mulheres Quilombolas.

Em 2015, quando o número de comunidades identificadas pelo movimento quilombola já é de 640, a N‘Golo dá início ao Canjerê – Festival de Cultura Quilombola de Minas Gerais, realizado até o ano de 2018. Em cada uma das suas três edições, o festival leva mais de 800 quilombolas, de diversas regiões de Minas Gerais, para Belo Horizonte, onde participam de debates políticos e manifestações culturais, como congados, reinados, entre outros. O festival é uma forma importante de trazer visibilidade pública para a questão quilombola no estado, suas demandas e modos de expressão.