Movimento de Mulheres Negras


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O movimento de mulheres negras é um conjunto de organizações, coletivos e redes antirracistas brasileiras, que tem por critério o enfrentamento do machismo e do sexismo e a defesa dos  direitos das mulheres, levando em conta a intersecção entre raça, gênero e classe.

Com a emergência de diversos movimentos sociais no final da década de 1970, as mulheres negras se organizam de forma autônoma e instituem, em forma de coletivos políticos, o Movimento de Mulheres Negras, ainda durante o período da ditadura civil-militar no Brasil (1964-1981). Os primeiros grupos são a Remunea – Reunião de Mulheres Negras Aqualtune (1978), Luiza Mahin (1980), Coletivo de Mulheres Negras de São Paulo (1982) e o Nzinga (1983). 

Durante a década de 1980, esses coletivos crescem e se consolidam em diferentes estados: Mãe Andresa, no Maranhão (1986); Coletivo de Mulheres Negras, em Minas Gerais (1986); Maria Mulher, no Rio Grande do Sul (1987). Logo depois, surge a  primeira organização não governamental de mulheres negras: o Geledés – ​​Instituto da Mulher Negra, fundado em 30 de abril de 1988. 

No mesmo período surgem os primeiros encontros de mulheres negras. O I Encontro Estadual de Mulheres Negras do Rio de Janeiro, é realizado na capital fluminense em 1983, e volta a ser realizado dois anos depois no mesmo estado. Em 1988, acontece o I Encontro Nacional de Mulheres Negras, em Valença (RJ). Em 1991, Salvador (BA) sedia o segundo encontro.

Ao passar a atuar por meio de organizações autônomas, os movimentos de mulheres negras começam a receber críticas. Sugere-se que contribuem para a fragmentação das lutas realizadas pelo feminismo e pelo movimento negro. As mulheres negras, entretanto, entendem que a criação de um movimento que contempla as demandas políticas delas não provoca divisionismo político, mas promove a luta contra a invisibilidade de causas específicas das mulheres e privilegia seu protagonismo.  A formação desses coletivos se dá a partir de reflexões e problematizações a respeito do sexismo e do racismo estruturados nos vários segmentos da sociedade.

Lélia Gonzalez (1935-1994) e Maria Beatriz do Nascimento (1942-1995) são personalidades que contribuem para essas reflexões e se tornam referências importantes para a constituição dos grupos de mulheres negras e para demais militantes de outras gerações, como Sueli Carneiro (1950), Luiza Bairros (1953-2016), Edna Roland (1951) e Vilma Reis (1969).

A partir da década de 1980, mulheres negras começam a ocupar espaços políticos institucionais e surgem os primeiros órgãos de defesa dos direitos das mulheres. Porém, para que as mulheres tenham participação efetiva nos espaços de poder,  são necessárias diversas negociações. Em 1983, é criado o Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo (CECF/SP); o órgão, todavia, não tem representatividade de mulheres negras. Depois de muita mobilização, é criada a Comissão de Mulher Negra do CECF/SP. Entretanto, a primeira mulher negra chega à presidência do conselho somente após 1995. Trata-se de Maria Aparecida de Laia, psicóloga e assistente social, nomeada por duas gestões consecutivas.

A ocupação de espaços políticos institucionais por mulheres negras ocorre também em outros estados, como no Rio de Janeiro, onde a médica Edialeda do Nascimento (1941-2010) assume a Secretaria de Estado de Promoção Social – ela é a primeira mulher a ocupar tal espaço. Ainda no Rio de Janeiro, em 1987, Vanda Maria de Souza Ferreira ocupa o cargo de dirigente da Divisão de Educação e Cultura do Sistema Penal da Secretaria Estadual de Justiça. 

Na década de 1990, outras organizações não governamentais de mulheres negras são criadas, como Criola (1992), no Rio de Janeiro, e diversas atividades são realizadas, como o I Seminário Nacional de Mulheres Negras, em  Atibaia (SP), e o Seminário Nacional de Políticas e Direitos Reprodutivos das Mulheres Negras, em Itapecerica da Serra (SP), ambos em 1993. Esses encontros são fundamentais para o fortalecimento das reivindicações políticas desse movimento social, fortalecendo suas identidades e estratégias políticas. 

Depois da Conferência de Durban, em 2001, a Articulação de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB) é criada em 2002, com a reunião de 29 organizações. Outro espaço importante para o ativismo do movimento é o Fórum Nacional de Mulheres Negras (FNMN), voltado para o monitoramento de políticas públicas. Essas organizações nacionais revelam o poder de articulação das entidades e ONG distribuídas no território brasileiro.

O uso das redes sociais como ferramenta de trabalho pode ser considerado uma novidade para o trabalho dessas organizações nos primeiros anos do século XXI. As redes não apenas  funcionam como plataforma de criação política, mas também permitem alcançar territórios e pessoas de regiões do país e do exterior. Tome-se o exemplo de Blogueiras Negras, grupo midiático que, no campo alternativo das mídias sociais, consegue problematizar assuntos do interesse do feminismo negro local e internacional, pautando temas gerais e específicos que têm relevância para a população negra e feminina, trans, hétero e homossexual. 

Com essa longa trajetória, o movimento de mulheres negras brasileiro torna-se uma das referências mais importantes para o feminismo latino-americano. Suas intelectuais, organizações e redes de ativismos são estudadas no mundo inteiro e se tornam fonte de inspiração para o feminismo global.