Hamilton Cardoso
1953
1999
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Hamilton Bernardes Cardoso (Catanduva, São Paulo, 1953 – São Paulo, São Paulo, 1999). Jornalista, editor, intelectual público, analista político, fundador do Movimento Negro Unificado (MNU). Atua como porta-voz da luta contra o racismo e suas interfaces com a esquerda brasileira e está presente nas lutas pela democratização do país. Além disso, o conjunto de seus escritos são referências para o marxismo negro brasileiro.
Na década de 1960, estuda na tradicional escola Caetano de Campos, no centro de São Paulo. Prossegue com os estudos universitários em jornalismo na Faculdade Cásper Líbero e na Faculdade Metodista Rudge Ramos. Sua formação em comunicação é fundamental para o ativismo político e a carreira profissional.
Quando jovem, aproxima-se do grupo Centro de Estudos e Arte Negra (Cecan), conduzido por Thereza Santos (1930-2012), atriz carioca e moradora da cidade de São Paulo. Ela é coautora da peça E agora falamos nós, na qual Hamilton Cardoso trabalha como ator no início da década de 1970. A obra retrata dos temas e influências do movimento negro brasileiro, emergente durante os anos mais sombrios da ditadura civil-militar (1964-1985).
Nesse mesmo período, integra a Liga Operária, organização trotskista fundada na Argentina por exilados brasileiros. Entre 1977 e 1978, a Liga Operária se une ao jornal Versus, na cidade de São Paulo. Em conjunto com outros intelectuais e militantes negros, passa dirigir a coluna “Afro-Latino-América”, que se torna uma importante referência da imprensa negra brasileira. Nessa empreitada, conta com a parceira de Oswaldo de Camargo (1936), Jamu Minka, Neusa Maria Pereira (1948) e Tânia Regina Pinto.
Nessa coluna, usa ora o nome de batismo ora o pseudônimo Ndacaray Zulú Nguxi. Entrevista militantes negros importantes, traz experiências de lideranças negras de outras partes do mundo, especialmente dos Estados Unidos, e dos países africanos que passam por processos de independência e revolucionários. Além do mais, o periódico Versus traz reflexões sobre o apartheid na África do Sul e as lutas contra esse sistema de opressão racial.
Ativo na militância negra, participa de encontros, eventos e atividades em São Paulo e no interior do estado. Quando Lélia Gonzalez (1935-1994) escreve o livro Lugar de negro (1982) em parceria como o argentino Carlos Hasenbalg (1942-2014), Hamilton Cardoso é uma das fontes entrevistadas para caracterizar a nova cena do ativismo negro no Brasil. Contribui também com o cientista político estadunidense Michel Hanchard na pesquisa sobre mobilizações antirracistas, concede entrevistas e informações sobre a realidade das relações raciais e os limites do ativismo negro no país.
Sua relevância na organização do movimento negro em São Paulo é tão intensa que se torna uma das figuras de destaque nas imagens sobre o ato público de formação do MNU, organização da qual é um dos fundadores. Como intelectual, identifica-se com o marxismo de pensadores como Florestan Fernandes (1920-1995), Octavio Ianni (1926-2004) e Clóvis Moura (1925-2003). Como eles, associa a temática racial ao problema das desigualdades das classes, sem hierarquizar essas duas dimensões da vida social. Ainda, como grande parte da sua geração, defende a “consciência negra” como fundamento para a ação coletiva.
No jornalismo, atua também como repórter na TV Cultura e produz matérias para o jornal Folha de S.Paulo. É um dos criadores da Lua Nova – Revista de Cultura e Política. Em 1981, edita em São Paulo a revista Eboni, que trata de cultura e política.
Pelo investimento forte com as esquerdas políticas, seu pensamento é marcado pela interface entre os conceitos de raça e classe. Socialista, o autor busca ao longo dos seus textos refletir sobre a questão racial no contexto capitalista. Alguns de seus artigos são referências para entender questões centrais dos movimentos sociais que lutam pela democratização do Brasil, como racismo, desigualdades e violência. Seus esforços intelectuais buscam mostrar que a democracia no país, particularmente durante a reforma constitucional, deve incluir negros e indígenas nas reflexões, pois a história política do Brasil até aquele momento é pensada apenas para a população branca.
Crítico da condução elitista dos processos decisórios no país, Hamilton Cardoso escreve sobre as lutas políticas contemporâneas, questiona personalidades negras que negam a existência do racismo e investe fortemente na construção de imagens negras positivas na história do país, a exemplo de Zumbi dos Palmares (1655-1695). A relevância de sua trajetória e produção intelectual está na difusão das reivindicações dos movimentos negros do qual faz parte e da produção sobre a relações entre raça e classe, configurando-se como um pensador do marxismo negro no Brasil.